Carona com Mujica
16/09/15 09:43Disse que ia de carona e acrescentei que estava escrevendo um blog sobre a viagem. Ele sorriu e disse que precisaria de muita carona. Comentou que era adepto do Santo Daime e que já estivera no Acre.
Conheceu também o cartunista Glauco, morto em 2010, e que já esteve em seu sítio, próximo de São Paulo. Iria explicar que eu também o conhecia, por trabalhar no mesmo jornal, mas a carona estava chegando ao fim. Desci do carro bem perto da alfândega onde um dia antes tentava pegar carona, e, antes de ir embora, ele me disse para lhe enviar o blog que gostaria de ler, anotei e ele então seguiu em frente.
Após três horas sem sucesso na alfândega , percebi que ali não era um bom lugar para pegar carona. Mudei de estratégia de novo e comecei a caminhar pela estrada. Funcionou na rodovia estadual ERS 699, deveria funcionar na Br 471. Comi minhas últimas fatias de pão de forma com a última lata de sardinha antes de partir.
Bingo. 15 minutos de caminhada e um caminhão com placa do Uruguai estacionou logo à minha frente. Com certeza não queria pedir informação, por isso corri meio desengonçado com a mochila pesada nas costas e subi na cabine, ajeitando minhas coisas nos pés antes de cumprimentar o motorista.
Até aí os uruguaios estavam em vantagem comigo. Até que o velho caminhão seguiu na extensa reta da estrada que corta os banhados do Rio Grande do Sul.
Duas horas de conversa sobre Mujica, liberação da maconha e tudo mais, eu tirei minha câmera da bolsa. Comecei a fotografar a estrada, com a intenção de, depois, tirar uma foto dele.
Foi quando sua expressão facial mudou e ele perguntou o que eu estava fazendo. Expliquei que era fotógrafo e que estava registrando minha viagem.
Com um tom mais sério ele pediu que eu parasse. “Fotos no meu caminhão eu não permito!”, exclamou.
Sem entender o que estava acontecendo, desliguei e resolvi não insistir.
O silêncio tomou conta da cabine. Quando faltavam uns 50 quilômetros para chegar ao meu destino, a cidade de Rio Grande, ele parou no acostamento e disse que só poderia me levar até ali porque tinha que entrar numa cidade logo à frente para fazer manutenção do caminhão.
Achei estranho, mas não tinha outra opção. Antes de descer, fui cumprimentá-lo pela carona e percebi que, na capa do seu celular, que estava entre os bancos, havia um adesivo com um desenho de uma folha de maconha e a palavra “cannabis”. Desconfiei que ali estava o motivo de não poder fotografar dentro do caminhão, já que dentro do Brasil apologia à maconha ainda é crime.
Desci no escuro e sem ter um segundo plano em mente. Resolvi caminhar pela estrada até encontrar um louco que desse carona para um andarilho a noite.