Sol de primavera
24/09/15 07:07Depois de desembarcar do ônibus que me trouxe de Praia Grande (SC) a Cambará do Sul (RS), resolvi seguir o conselho do motorista, Jose Pola, e peguei a RG-020, que liga Cambará do Sul a Caxias do Sul.
Andei por um quilômetro pela estrada estadual até chegar em frente a uma fazenda de criação de ovelhas, um vasto campo verde com araucárias por todo lado. Fiquei por ali na expectativa de que conseguisse carona, mas depois de duas horas, nada.
Quando já se passava das 17h, comecei a preparar um plano e tentar acampar bem próximo à cerca desta fazenda, já que o local era gramado e não havia outro lugar mais plano.
Minutos depois, uma caminhonete nova, destas importadas, japonesas, encostou próximo da porteira de madeiras pintada de branco. Era o senhor Roberto, um gaúcho forte, bigode farto, e proprietário da fazenda.
Ele então perguntou se eu precisava de alguma coisa, eu disse que estava tentando ir para Caxias do Sul, de carona. Porém, o dia estava acabando e eu precisava passar a noite ali próximo à cerca de sua fazenda.
Ele ficou por alguns segundos observando minha mochila, e, depois, disse: coloca suas coisas aí atrás e entra aqui. Não titubeei. Joguei a mochila na caçamba e entrei.
Ele seguiu por uma estrada onde os dois lados tinham gramados lindos, planos, e, em qualquer lugar, serviria para eu montar minha barraca. Ele então parou e apontou para um pequeno morro, com o mesmo gramado e com uma floresta de araucárias. “ Pode montar sua barraca ali e passar a noite aqui, é mais seguro pra você, tchê”, disse ele.
Eu agradeci e disse que logo cedo sairia para a estrada estadual RG-020, para tentar carona.
A noite foi de lua, com céu claro, e o amanhecer com os primeiros raios de sol do início da primavera. Depois de mais de sete dias sem ver o sol, aquele foi o amanhecer mais bonito desde que parti do Chuí (RS), no dia 14 de setembro.
Desmontei tudo logo cedo e às 8h já caminhava na estrada em direção à rodovia. Quando ouvi uma buzina de longe resolvi parar e olhar para trás:era o senhor Roberto vindo em minha direção.
Ele parou e disse que estava mandando um de seus funcionários para Lages (SC), buscar um parente dele, e antes iria a Caxias do Sul levar uma peça para o conserto. Perguntou se eu queria uma carona.
Aceitei, informei que na verdade queria ir para Lages (SC) e se ele não se importava de o funcionário me deixar lá. Ele exclamou, “ Quem vai para Caxias, vai para Lages. Você escolhe onde quer ficar”.
Pensei comigo, consegui uma boa carona, sem levantar um dedo.
Ao entrar naquela caminhonete nova, de bancos de couro, fui logo perguntando o nome do funcionário, para iniciar uma conversa, já que a viagem iria durar o dia todo.
O rapaz mal olhou para mim e disse que era Gustavo, ligou o som com uma música sertaneja alta e tocou estrada a dentro, sentido Caxias do sul, com cara de poucos amigos
Percebi que o rapaz não estava para conversa e criei duas teorias sobre o seu mau humor: ou ele brigou com a namorada ou está insatisfeito com o trabalho.
Como estava cansado, aproveitei e perguntei se ele se importaria se eu descansasse um pouco na viagem. Ele, sem olhar pra mim, balançou a cabeça como positivo. Eu, então, apaguei.
Acordei bem mais tarde, com minha cabeça indo para lá e para cá. Estávamos subindo a serra da Capivara, ainda no Rio Grande do Sul. Aproveitei para fotografar um pouco o trajeto, enquanto o meu amigo mal humorado seguia, como se não existisse ninguém ali do lado.
O único momento em que ele se dirigiu a mim foi na chegada a Lages. Já passava das 20h e ele perguntou onde eu gostaria de ficar. Eu disse que, se pudesse, em algum posto movimentado de caminhões para eu tentar uma carona.
Com seu mau humor peculiar, ele disse: “aqui todos os postos tem caminhões”. Para não prolongar mais aquele mau humor, eu disse: “então me deixe em qualquer um”.
Ao desembarcar, eu me despedi e agradeci. Ele apenas balançou a cabeça e foi embora.
Meu novo desafio agora era encontrar um canto para passar a noite e no dia seguinte tentar chegar ao interior do Paraná.