Salvo por um corintiano de Carapicuíba
25/09/15 07:03.
Após 10 dias do início desta viagem no Chui (RG), desembarquei em um posto na BR-116, logo na saída de Lages, vindo de Cambará do Sul (SC), procurei pelo gerente, Rogerio, e lhe pedi descaradamente um trabalho para pagar minha refeição. Havia passado o dia sem comer nada, e minhas reservas de dinheiro estavam baixas.
Rogerio disse que não tinha nada naquele momento, nem faxina, mas se ofereceu para pagar um prato de comida no restaurante ao lado.
Sem vergonha de dizer, devorei uma montanha de arroz, feijão, um ovo e macarrão. Dez minutos foram o suficiente para o prato estar limpo.
Após o belo jantar, escolhi um depósito abandonado, que fica atrás do posto para passar a noite. O gerente havia autorizado, e os funcionários ainda me ajudaram com caixas de papelão para forrar o piso, que estava sujo. Tirei meu saco de dormir e só abri os olhos com o dia amanhecendo.
Me preparei para pegar uma carona, logo cedo. Fui ao banheiro para um meio banho e já me coloquei próximo às bombas, acreditando que logo sairia dali.
Oito, nove, dez, onze horas da manhã e nada de caronas. Utilizei todas as técnicas de interceptação feita pelos frentistas. Não funcionou. Coloquei a placa com o nome da cidade e nada de aparecer caronas. Pergunta para um, perguntava para outro e ninguém iria para Santa Cecília, a cidade mais próxima.
Resolvi sair do posto e ir para a BR. Poderia ter mais chances com os carros que não entravam no posto. Uma hora depois e nada. Muitos, ao passar pela minha placa com os dizeres “ Santa Cecilia”, fingiam não ver.
Tentei uma tática suicida: pegar minha mochila e andar pela BR-116. Quem sabe alguém olharia e resolve parar. Porém, retornei ao posto para abastecer minha garrafa de água no bebedouro e, ao entrar, observo um furgão branco com placa de Carapicuíba (SP).
Me aproximei do motorista como se fosse um velho amigo e disse: “ Olá, tudo bem? Você é de Carapicuíba? ”. Ele, sem muita ação e achando ser algum conhecido que ele não reconhecia, disse que sim. Eu, então, expliquei que estava indo para Santa Cecília, cerca 100 quilômetros dali.
Ele, meio sem jeito, disse que iria, porém, que iria demorar. Tinha de almoçar antes. Eu disse que não me incomodaria e esperei.
Aprendi mais uma tática para pegar caronas, se passar por velho amigo.
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Rodrigo da Silva, 36, um corintiano de Carapicuíba, trafega entre São Paulo, (SP) e Porto Alegre, (PA) toda semana. Não é de falar muito, puxou pouca conversa, não me perguntou nada, mas não era mau humorado, apenas quieto.
Eu, então, aproveitei e disse que, se ele pudesse, poderia me deixar na cidade de Campo do Tenente (PR), 270 quilômetros à frente. Ele disse tudo bem.
Rodrigo contou que já foi assaltado. Ao desembarcar uma mulher, dois homens se aproximaram e levaram todo seu dinheiro. Ele diz ter certeza de que a mulher planejou tudo e, por isso, tinha medo de dar caronas. Disse que não usava saias e que ele poderia ficar tranquilo. Ele sorriu e pareceu mais aliviado.
A trilha sonora variou. Foi de sertanejo ao rock, passando por MPB e até um jazz, conforme as rádios iam saindo da frequência. Ele sintonizava outra com todo estilo de música e assim foi a viagem toda.
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Às 17h, eu desembarquei na pequena cidade de Campo do Tenente, e, mais uma vez, fui procurar um canto para passar a noite e, no dia seguinte, seguir para o Leste do Paraná. Com fome e sem almoçar, gastei mais R$ 10 com um prato no pequeno restaurante, bem na entrada da cidade.
Minha receita caiu para R$ 69,50. Até que sobrevivi bem, sem gastar muito.
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